Eu já disse o quanto o livro O Gene Egoísta, de lavra do
ilustre Richard Dawkins é uma leitura no mínimo interessante para quem anda com
caraminholas na cabeça a respeito de como opera as vontades humanas na hora de
escolher uma cara metade? É verdade que o livro trata do comportamento animal
de forma geral (embora pontue alguns comportamentos particulares como o dos
elefantes-marinhos, tricópteros e louva-deuses), mas cai como uma luva na
espécie humana. Afinal de contas, no que pese sermos os primeiros alforriados
da tirania dos genes, continuamos prisioneiros de nossa sina animalesca.
Em determinado ponto o livro aborda o problema da teoria dos
jogos chamado de o Dilema do Prisioneiro para abordar a questão do Altruísmo x
Egoísmo das espécies. Resumidamente a história é a seguinte: A e B são presos
pela polícia, que possui provas suficiente para condenar os dois criminosos,
mas separando-os, oferece o mesmo acordo para ambos:
1) Se um testemunhar e
o outro se manter em silêncio, aquele ganha a liberdade ao passo que este é
condenado a 10 anos de prisão.
2) Se ambos se manterem
em silêncio, ambos recebem uma pena reduzida de 6 meses de prisão.
3) Se ambos
testemunharem um contra o outro, ambos recebem 5 anos de prisão.
Lembrando que os
prisioneiros não sabem a escolha um do outro.
A princípio, a melhor escolha nos parece testemunhar contra
nosso parceiro de crime. Se ele escolhe o silêncio, obtemos o melhor resultado.
Se, no entanto ele escolhe testemunhar contra nós, pegamos 5 anos de cana, mas
esse é um destino mais agradável do que se manter em silêncio e pegar o dobro
da pena.
Digo a princípio, porque qualquer pessoa com um mínimo
pensamento lógico chega a essa conclusão e percebe que o mais provável é que
fatalmente ambos pegarão 5 anos de cadeia, já que um testemunhará contra o
outro. No entanto, se os dois jogadores decidem se manter em silêncio, poderão
reduzir 4 anos e meio de pena, um tempo considerável.
Eis que aí surge o dilema: qual das duas lógicas o parceiro
de crime escolheu? Cooperar ou trair? Na natureza encontramos os dois extremos:
de um lado, o louva-deus fêmea devora a cabeça do macho durante a cópula para
que este perca o controle do sistema nervoso e provoque na fêmea um alto índice
de fecundidade ao mesmo tempo em que faz um lanchinho para manter as reservas
energéticas necessárias para cuidar de suas crias (isso quando o apetite é
moderado, se a fome for muita, o pobre louva-deus macho é devorado por
completo). Já os injustiçados morcegos-vampiros (também conhecidos como
morcegos hematófagos), considerados por muitos como criaturas nefastas dos
contos góticos vitorianos, possuem um padrão de cooperação mútua que auxiliam
na perpetuação da espécie ao longo do tempo.
E o que é que essa chatice toda tem a ver com
relacionamentos, você me pergunta. Elementar, meu caro Watson: em tempos de
delação premiada e de mulher que faz unha no motel com gordo, eu diria que tem
bastante a ver, ou melhor, TUDO a ver.
O Dilema do Prisioneiro
diz muito a respeito dos dilemas (e escolhas) pelos quais todos os
relacionamentos passam: ficar com ela até que a novinha nos separe ou até que a
morte nos separe? Ficar com ele até que o desemprego nos separe ou até que a
morte nos separe?
Não se engane: a situação é mais comum que você pensa, e o
resultado na maioria esmagadora dos casos acaba em traição: (de um modo geral, e
não só a traição com amante).
As espécies, de modo
geral, tem algo a seu favor: a oportunidade
de retaliar caso seja penalizada por uma traição. Vamos considerar as seguintes possibilidades.
1) Lindinha namora com Riquinho. Riquinho e Lindinha possuem
poderes de barganha altos e equivalentes, mas com o tempo o poder de barganha
de Feinh... digo, Lindinha começa a cair drasticamente ao passo que o de Dan
Bilz... digo, Riquinho só aumenta. Riquinho, opta por retaliar já que Lindinha “traiu” seu investimento,
dando-lhe prejuízo. Riquinho termina com Lindinha e passa a namorar Florzinha.
Para o dessabor de Lindinha, nenhum homem parece demonstrar interesse nela já
que está velha e feia. Lindinha morre sozinha com uma penca de gatos a
tiracolo.
2) Lindinha namora com Pobrinho. Pobrinho e Lindinha tem
poderes de barganha diametralmente opostos: Pobrinho tem poder de barganha
quase inexistente, ao passo que Lindinha tem um poder de barganha
estratosférico. Apesar de tudo, Pobrinho é esforçado: estuda, trabalha e tem
verdadeira devoção por Lindinha. O tempo passa, e Feinh... ops, Lindinha já não
é mais aquela: titio Cronos, vulgo Fanfarrão, deu as caras. Pobrinho agora é
concursado federal e tem o mesmo poder de barganha estratosférico que sua amada
tinha há tempos atrás. Apesar dos poderes de barganha terem invertido, Pobrinho
lembra do sacrifício de Lindinha em estar com ele em sua juventude e opta por cooperar. Lindinha e Pobrinho
morrem dividindo a mesma paixão; e a mesma dentadura também.
Notem que são casos bastante pontuais e o fato de você
namorar com um pobre coitado na sua juventude não vai garantir que ele vai
estar lá para você na sua velhice. O mesmo pode ser dito para aquelas que
namoram com um alfa badass from darkest
hell: namorá-lo não significa que você acabará o fim dos seus dias sozinha.
Porém, eu gostaria de
fazer aqui alguns adendos: o cara feinho da escola/faculdade exala carência. A
escassez traz a valorização. Veja como tratamos a água no nosso dia a dia e um
africano subsaariano a trata. As chances de ele permanecer contigo mesmo que no
futuro você vire Jabba the Hutt (ok, ok, ok... não é pra TANTO né...) são
imensas. Já o playboy tem mulheres a
todo tempo e a todo lugar. As chances de você se parecer mais com um bem de
consumo do que com um ser humano aos olhos dele não devem ser ignoradas.
Então tudo se resume a pagar na juventude e ganhar na velhice
ou vice-versa? Ok, então prefiro ganhar na juventude e pagar na velhice já que
pelo menos tenho a garantia de que aproveitarei bem pelo menos uma fase da
minha vida! Esse pensamento, apesar de
tentador, é uma grande armadilha para as mulheres, e aqui explico o por quê (ou
porquê, ou por que, ou porque, foda-se, eu sempre detestei os porquês): estudos
conduzidos na Inglaterra indicam que as mulheres alcançam o ápice de seu poder
de barganha aos 30 anos (quando são laureadas balzaquianas), ao passo que os
homens alcançam aos 40, uma diferença de 10 anos. Quando uma mulher opta por um
Riquinho, o mais provável é que o encanto que ele tem por ela acabe quando ela
tiver cerca de 30 anos. Passará cerca de 50 anos sozinha, se considerarmos que
ela viva 80 anos. Se, no entanto, ela optasse pelo Pobrinho, poderia ganhar 50
e perder 30.
Não podemos também esquecer que existem os santos (ou seriam
idiotas?) que insistem em cooperar mesmo diante de reiteradas traições. Talvez
seus genes se perpetuem, mas sua máquina de sobrevivência será punida do início
ao fim de sua existência. Considerando que somos os únicos a nos rebelarmos
contra os replicadores, acredito que devamos pensar mais em nossas máquinas de
sobrevivência do que nos nossos pequenos hóspedes.
Claro, tudo se resume a escolhas. Se sua intenção é curtir a juventude
e arranjar um idiota que nunca teve a oportunidade de curtir a vida para arcar
com todos os ônus ao passo que você vai gozar de todos os bônus, boa sorte. Se
sua intenção é sacrificar sua juventude para aproveitar sua vida adulta e sua
velhice com um cara que tem grandes chances de gostar de você, mesmo depois de
Cronos tê-la massacrado, parabéns, você talvez não tenha feito a escolha
perfeita mas sem sombra de dúvidas está longe de ser uma escolha estúpida.
Para laurear com a devida pompa este texto, peço a licença de
tomar de empréstimo a sabedoria lapidar do saudoso Pablo Neruda: “Você é livre para fazer suas escolhas, mas
é prisioneiro das consequências.”
Au
revoir!